O que é um mecanismo de reclamação?
Segundo os Princípios Orientadores da ONU para Empresas e Direitos Humanos, o termo “mecanismo de reclamação” é definido como “um meio formalizado por pelo qual indivíduos ou grupos podem levantar preocupações sobre o impacto que uma empresa tem sobre eles — incluindo, mas não exclusivamente, sobre seus direitos humanos — e podem buscar reparação ou remediação. Os propósitos de tal mecanismo incluem: primeiro, permitir que as partes interessadas (incluindo comunidades locais) levantem preocupações e forneçam feedback oportuno sobre impactos adversos aos direitos humanos que as atividades de uma organização podem causar; segundo, complementar o processo de devida diligência de direitos humanos; e terceiro, permitir que essas partes interessadas reivindiquem uma reparação se o efeito adverso já tiver sido causado. Os mecanismos de reclamação também são úteis para complementar a análise de riscos de uma empresa e informá-la sobre impactos adversos que não puderam ser identificados no seu exercício de devida diligência. Trata-se, portanto, de uma solução preventiva, cujo objetivo principal é evitar a escalada de problemas sociais, funcionando também como um sistema de alerta e resposta precoce para violações de direitos humanos
O Nossa Voz, então, é um mecanismo de reclamação?
Sim. O Nossa Voz se alinha com o que a ONU prevê sem seus “Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos”, mas entrega ainda mais. Para além de receber reclamações, o Nossa Voz é uma linha de ajuda para questões laborais, onde tanto trabalhadores, trabalhadoras e o setor produtivo podem recorrer para sanar eventuais dúvidas que tenham relacionadas ao contrato de trabalho e suas eventuais decorrências. Pode também ser um ponto de partida para um acordo ou convenção coletiva, por exemplo, já que a CONTAR (entidade sindical operadora do Nossa Voz) pode prestar seu serviço de conciliação e negociação coletiva, ajudando assim as partes a encontrarem soluções justas para determinadas questões. Ainda, o Nossa Voz desenvolve um amplo trabalho de prevenção e conscientização, com divulgação de campanhas sobre direitos e deveres e treinamentos focados na promoção do trabalho decente. Isso tudo acontece no nível das fazendas que utilizam o Nossa Voz, como também em comunidades vulneráveis.
E quais são as vantagens de ter um mecanismo de reclamação?
O mecanismo funcionará como meio preventivo à escalada de violações de direitos humanos em determinado setor produtivo. Por meio da linha de ajuda, é possível dar voz aos trabalhadores impactados pelas atividades e operações de determinada empresa para que possam apresentar as suas preocupações, quando acreditam que são ou serão adversamente afetados. As empresas também são beneficiadas. Ao analisar as tendências e os padrões das interações com a linha de ajuda, elas podem identificar problemas sistêmicos e aperfeiçoar suas práticas. Ou seja, esses mecanismos tornam possível que as reclamações, assim que identificadas, sejam tratadas e que os impactos adversos sejam reparados antecipadamente, impedindo, assim, que os danos ocorram.
Que tipo de interação o Nossa Voz pode receber?
Como uma linha de ajuda, o Nossa Voz está disposto a receber dúvidas, tanto de trabalhadores e trabalhadoras, quanto do setor produtivo, sobre questões relacionadas ao contrato de trabalho e suas decorrências. Em um outro nível, atua também para endereçar reclamações relacionadas a irregularidades trabalhistas, como por exemplo, condições de saúde e segurança no trabalho, remuneração, horas extras, questionamentos contratuais e, também, possíveis violações a direitos humanos. Procuramos identificar as causas das reclamações, prever um plano de ação corretivo com a participação das partes envolvidas e resolver, remediar e/ou mitigar seu impacto.
O que acontece se forem identificadas violações aos direitos humanos?
Após uma análise compreensiva de cada caso, havendo indícios de violações de direitos humanos e situações que possam colocar em risco a vida dos trabalhadores, o Protocolo de Atuação do Nossa Voz prevê o acionamento dos serviços públicos relevantes.
E por que a cadeia produtiva do café foi escolhida para o projeto piloto?
Entre 1995 e 2021, 55.303 trabalhadores foram resgatados do trabalho escravo no Brasil. Destes, 3.118 trabalhavam na colheita do café. Nos últimos 5 anos, o cultivo de café foi o setor que mais apresentou resgates do trabalho escravo. No mesmo sentido, o país registrou 85 casos de crianças e adolescentes encontrados em situação de trabalho infantil na cafeicultura entre 2017 e 2022. Tais dados colocam a cadeia produtiva em evidência no que tange à necessidade de implementação de mecanismos mais rigorosos de monitoramento, controle e devida diligência em direitos humanos.
Como o Nossa Voz é mantido?
A estrutura do Nossa Voz é atualmente mantida por meio de um projeto de cooperação técnica internacional financiado pelo Departamento de Estado do Governo Americano (USDOS). Até 2026, a iniciativa será mantida com estes fundos. Para alcançar sua sustentabilidade, o Nossa Voz está desenvolvendo um plano de sustentabilidade que contará com a contribuição compartilhada entre os parceiros a partir do fim do financiamento externo.
E por que é importante ter um mecanismo de reclamação?
Ter um mecanismo de reclamação está entre as principais recomendações internacionais para que o setor privado exerça uma devida diligência mais eficaz em direitos humanos entre fornecedores diretos e indiretos e atue para prevenir e remediar violações de direitos humanos em cadeias produtivas.
A iniciativa será estendida para outros setores produtivos?
O modelo do Nossa Voz foi desenvolvido de maneira que possa ser replicado em qualquer cadeia produtiva rural. Principalmente os setores econômicos que atuem na exportação de commodities deverão implementar mecanismos de reclamação para atender às exigências das leis internacionais de devida diligência em direitos humanos. A ideia de expansão setorial é benéfica para todos, significando uma maior eficácia e compartilhamento de custos entre os players do mercado.
Como se dá a participação do setor privado?
As empresas que se tornarem parceiras do Nossa Voz terão o privilégio de participar de uma iniciativa inovadora que conta com um processo de construção legítimo e amparado por um mecanismo sólido de monitoramento e controle. Ao fazer a adesão ao Nossa Voz apresentamos a ferramenta a cadeia de fornecedores das empresas e avançamos com os interessados na adesão. Estes fornecedores escolhem seus pontos focais que serão o contato entre o Nossa Voz e as demandas de trabalhadores. Mensalmente fornecedor e empresa colhem os benefícios do Nossa Voz através de nossos relatórios e conseguem levantar potenciais riscos e oportunidades de melhoria em suas cadeias produtivas.
Qualquer tipo de empresa pode participar? Quais os requisitos?
Toda empresa que faça parte de uma cadeia produtiva rural e tenha ou compre insumos relacionados às atividades da agropecuária pode buscar os gestores do Nossa Voz. Dentre alguns exemplos de parceiros e participantes do Nossa Voz temos: pequenos produtores, grandes fazendeiros, cooperativas, traders agropecuários e multinacionais que dependem de insumos rurais, tais como torrefações.