Nossa Voz

Mecanismo de reclamação tem que ser eficaz

Por Guilherme Amado

A maioria das empresas brasileiras já implementou algum tipo de canal de denúncias, mas poucos desses canais constituem mecanismos de reclamação verdadeiramente eficazes conforme os critérios internacionais, especialmente os PO – Princípios Orientadores para Empresas e Direitos Humanos da ONU.
 
Entre extensos mapeamentos de riscos e detalhadas políticas corporativas, o mecanismo de reclamação é frequentemente reduzido a uma caixa de e-mail genérica ou uma linha telefônica terceirizada que raramente gera dados acionáveis.
 
No entanto, um mecanismo de reclamação robusto representa muito mais que compliance: é uma ferramenta estratégica que proporciona inteligência em tempo real sobre riscos emergentes, cria confiança com stakeholders ou detentores de direitos em situações vulneráveis e pode prevenir crises significativas.
 
Para ser eficaz, um mecanismo de reclamação deve atender aos oito critérios de eficácia dos Princípios Orientadores da ONU: legitimidade, acessibilidade, previsibilidade, equidade, transparência, compatibilidade com direitos, fonte de aprendizado contínuo e baseado em engajamento e diálogo.
 
Na prática, isso significa desenvolver canais que sejam:
 
·  Realmente acessíveis para todos os públicos impactados, incluindo trabalhadores terceirizados, comunidades remotas e grupos vulneráveis
·  Adaptados às realidades culturais, educacionais e tecnológicas locais
·  Administrados por equipes com independência e capacidade investigativa
·  Transparentes quanto ao processo de tratamento e prazos
·  Capazes de oferecer remediação efetiva, não apenas respostas formais
 
Tenho observado dentro da LRQA que empresas que desenvolvem mecanismos genuinamente participativos – co-desenhados com seus usuários pretendidos – conseguem taxas de utilização significativamente mais altas e melhor qualidade de informação.
 
O exemplo mais interessante que eu conheço é o Nossa Voz, linha de ajuda na cadeia de café, um projeto multistakeholder criado pelas mãos de muitos parceiros através de um processo de consulta ampla e que envolve a participação direta de representantes das empresas e dos trabalhadores.
 
O valor real de um mecanismo eficaz está na inteligência que ele gera: como ferramenta de gestão de riscos, como termômetro da efetividade de políticas e como canal direto com stakeholders afetados. Muito além do compliance, trata-se de uma vantagem competitiva num cenário onde a licença social para operar se torna cada vez mais determinante para o sucesso de longo prazo.
 
Sua empresa está tratando seu mecanismo de reclamação como um formulário de compliance ou como uma ferramenta estratégica?

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À medida que as cerejas de café começam a amadurecer nos cafezais brasileiros, marca-se não apenas o início de mais uma safra, mas também um período crítico para o monitoramento e garantia de práticas trabalhistas responsáveis e dos direitos humanos nas cadeias de fornecimento.

A colheita do café, que mobiliza milhares de trabalhadores temporários em diversas regiões produtoras do país, traz consigo tanto oportunidades econômicas quanto riscos potenciais de violações de direitos humanos que precisamos abordar com determinação.

Como profissional atuante no setor de sustentabilidade e direitos humanos dentro da LRQA, tenho observado que as fazendas que adotam práticas exemplares de recrutamento, contratação transparente e condições dignas de trabalho não apenas evitam riscos legais e reputacionais, mas também colhem benefícios concretos em produtividade e qualidade.

Quatro pontos críticos que merecem especial atenção neste momento:
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4. Mecanismos de reclamação eficientes como o Nossa Voz

A excelência na produção de café brasileiro, reconhecida mundialmente, deve ser acompanhada por excelência no tratamento dado às pessoas que fazem essa qualidade possível. Vamos honrar as mãos que produzem e colhem os nossos cafés! Vamos em frente…